Wednesday, January 25, 2006

Outras formas de estar aprisionado



Qualquer brasileiro estranha a liberdade ao chegar no primeiro mundo: praticamente não há grades nas janelas, não há porteiros nos prédios, os carros podem ficar na rua sem receio de serem riscados ou roubados, até os jornais são colocados, em muitos casos, na porta do assinante sem que ninguém toque no que não lhe pertence. Também pode parecer absurdo o fato de tantas lojas deixarem os produtos expostos nas calçadas, sem que alguém os vigie, e eles continuarem lá. Ou ainda, ao tomar sol em parques públicos, largar suas coisas sem receio de alguém levá-las e poder andar na rua a qualquer hora sem medo, mesmo morando em uma metrópole como Berlim.
Não que a criminalidade não tenha chegado aqui, ao contrário, casos de roubos e até mortes também podem ser vistos na imprensa (e tem, infelizemente, aumentado com o passar dos anos) mas em quantidade mínima se comparados com países violentos do terceiro mundo.
Como quase tudo na vida, no entanto, não poderia ser perfeito. Se a liberdade de andar nas ruas é grande, há outra forma de se sentir aprisionado: o frio! Várias vezes desisti de sair de casa por não ter vontade de me empacotar para ir as ruas mas jamais fora tão extremo como nesta semana. Desde domingo o noticiário avisa: só saia se realmente precisar e, no caso, agasalhe-se ao extremo. A temperatura chegou a menos 20 aqui em Berlim e no Sul da Alemanha, até menos 37 graus celsius.
Quem não ouviu as recomendações e arriscou, pagou com a vida. Foi o caso de uma senhora que queria buscar a correspondência na caixa do correio. O trajeto de alguns metros parecia uma inocente caminhada. A senhora, porém, caiu no meio do caminho e nunca mais levantou: não suficientemente agasalhada, congelou e morreu ali mesmo. Hoje, a notícia foi de outro senhor, de 62 anos, que não aqueceu sua casa e congelou na mesa da cozinha. Um vizinho estranhou a falta de fumaça na chaminé, entrou na residência que estava destrancada e tentou socorrer o aposentado, que morreu no hospital. Estas são apenas duas das dezenas de vítimas já registradas nos últimos dias por causa do inverno rigoroso.
A temperatura já está, no entanto, voltando ao normal e a tendência é termos a média de menos 5 nos próximos dois meses, não tão agradável mas suficiente para podermos sair e cumprir as rotinas diárias. Ainda bem, dificil sentir-se impotente e aprisionada por causa do mau tempo. Por outro lado, ao contrário da criminalidade a qual obriga inocentes a morarem atrás das grades em suas próprias casas, o inverno dura apenas três meses e quando chega a primavera volta, junto com as flores, a maravilhosa sensação de viver-se em um país civilizado e seguro.

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